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RPG de terror japoneses dos anos 80 (Parte 2)

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Como prometido, vim aqui trazer mais uma safra única de jogos bizarros de RPG de terror japoneses dos anos 80. Caso você não tenha visto a primeira parte desse artigo, recomendo dar uma passada lá acessando clicando neste link aqui, espero que goste!

Os bizarros RPG de terror japoneses dos anos 80

bizarros RPG de terror japoneses dos anos 80

Jaseiken Necromancer [邪聖剣ネクロマンサー] 1988
Ano de lançamento: 1988
Plataforma: PC Engine

Outro jogo com diversas influências do trabalho de Lovecraft, mas que também com grandes homenagens ao trabalho do artista plástico H. R. Giger, famoso por inspirar a estética do filme Alien.

Ignorando a tela título do jogo, Necromancer passaria fácil por mais um jogo bobo de RPG medieval. Com sua grama verde, música alegre e temática simples. Porém ao entrar em contato com o primeiro monstro e, ao invés de encontrar um bicho fofo ou uma bolha gosmenta animada, vemos um corpo deformado com as entranhas de fora sendo açoitado com esguichos de sangue a cada golpe, percebemos que tropeçamos em algo além do prometido.

O jogo foi alegadamente o primeiro RPG a ser lançado para PC Engine, um console inovador na época. Dragon Quest e Final Fantasy já haviam cativado o público japonês por RPGs e por isso o lançamento veio com uma grande expectativa que, infelizmente, não foi alcançada pelo jogo.

Os chefes finais do jogo são monstros icônicos do Cthulhu Mythos, não só os que foram criados pelo escritor Lovecraft (como Azathoth, Yog-Sothoth,e Nyarlathotep), como também monstros do Mythos que foram criados por outros autores como Hastur (criado por Ambrose Bierce) e Tsathoggua (criado por Clark Ashton Smith). Mas pelo que eu pude ver não são fiéis a suas representações literárias. Quem tiver com o japonês em dia e quiser arriscar, pode assistir esse gameplay dos últimos boss aqui.

Last Armageddon
Ano de Lançamento: 1988
Plataformas: PC-88 e MSX

Outro jogo que mergulhou na onda do Dragon Quest e procurou fazer uma subversões de gênero ao adicionar elementos de terror e ficção científica pós apocalíptica no enredo. Porém as subversões de gênero não acabam por aí.

Na história do jogo, a humanidade causou sua própria destruição e no planeta agora, vivem apenas monstros que não são afetados pelos desastres ecológicos do planeta. A vida demoníaca no mundo é simples e pacata, até alienígenas ciborgues invadirem o planeta e travarem guerra com os demônios em busca do controle do planeta.

No jogo, você controla uma equipe de monstros que, tipicamente, seriam os inimigos de jogos de RPG como Dragon Quest e Final Fantasy. O objetivo é destruir os invasores alienígenas e recuperar o planeta, a história é cheia de reviravoltas, menções e releituras de acontecimentos históricos humanos, onde é apresentado que os monstros na verdade, eram humanos modificados.

O jogo teve uma sequência não oficial em 1994 chamada “After Amargeddon Gaiden” lançada para Mega CD (add on do Mega Drive conhecido como Sega CD por aqui). A história traz algumas semelhanças com o título anterior como a reviravolta final, além de um complexo debate filosófico sobre as eras de destruição serem a necessidade de metamorfose do universo.

bizarros RPG de terror japoneses dos anos 80

Sweet Home
Lançamento: 1989
Plataforma: Famicon (Nintendo 8 bits japonês)

Talvez dessa lista, Sweet Home seja o jogo mais conhecido dentre os fãs do gênero. Chamado muitas vezes de “avô do Resident Evil” e do Survival Horror de forma geral. Sweet Home o jogo não só estabeleceu muito dos elementos principais comuns em survival horror do futuro, mas teve uma intrínseca história com Resident Evil.

Tokuro Fujiwara, diretor de Sweet Home e produtor do primeiro jogo da saga que estabeleceu o gênero Survival Horror, considerava Resident Evil como um remake de sua criação em 1998. De fato, mesmo o nome americanizado (“habitante maligno” em português) parece uma homenagem a Sweet Home, que como foco em seu enredo uma casa amaldiçoada.

O jogo foi lançado em conjunto com um filme de mesmo nome seguindo basicamente a mesma história. Uma equipe cinematográfica está fazendo um documentário sobre os belos afrescos (pinturas feitas em muros e paredes) do pintor Ichirō Mamiya. Porém, alguns dos seus afrescos estão escondidos numa misteriosa mansão. Amaldiçoada pelo fantasma de sua falecida esposa. Cabe a equipe sobreviver aos perigos da casa e tentar pacificar os espíritos que a habitam.

A história é de certa forma simplista, mas lida bastante com a mitologia japonesa e a forma como eles lidam com espíritos. Para exorcizar o fantasma da senhora Mamiya é preciso acalmar seu espírito, fazendo-a reencontrar com sua criança que morreu tragicamente na mansão. De qualquer forma, o grande diferencial do jogo é sua jogabilidade.

Jogabilidade única

São cinco personagens diferentes, cada um tem um item único fundamental para investigar a casa, assim como Jill Valentine e Chris Redfield tem respectivamente, um lockpick e um isqueiro para os ajudar na mansão em Resident Evil. Os itens únicos de Sweet Home são: Isqueiro, chave, kit de primeiros socorros, câmera fotográfica e aspirador de pó.

Outro recurso único de gameplay é que quando um personagem morre, eles não retornam. Um item que substitui seu item único reaparece em outro lugar da mansão e seu corpo permanece jogado na mansão e o final do jogo é alterado de acordo com a pessoa que morreu.

Um elemento um pouco confuso de gameplay é que, apesar de serem cinco pessoas na casa, você só pode formar grupos de no máximo três pessoas. Além disso, cada membro tem um limite de itens que pode carregar. Fazendo com que constantemente você tenha que trocar os membros do seu grupo para resolver os enigmas espalhados pela mansão.

As influências de Sweet Home na franquia Resident Evil são incontáveis. A ambientação claustrofóbica de uma mansão no meio de uma floresta, as animações de portas abrindo toda vez que você entra em um cômodo novo, a escassez de itens, o grande número de enigmas para avançar, etc. 

Porém a maior influência seria em “Resident Evil: Outbreak” esquecido spin-off da franquia lançado para Playstation 2 onde é possível jogar com uma diversa equipe onde cada um dos personagens tem uma habilidade individual.

bizarros RPG de terror japoneses dos anos 80

Produce
Ano de Lançamento: 1987
Plataforma: PC-88

De início eu fiquei na dúvida se incluia esse jogo nesta lista ou não. Ele tem pouquíssimo elementos que o fariam ser categorizado como RPG, mas a parte de terror “bizarra” sem dúvida compensa pela falta desses elementos. Trazendo um jogo que é um misto de slasher com body horror.

A história gira ao redor de quatro jovens adolescentes: Gilbert, Tina, Sayaka, e Toshio, numa viagem às montanhas. Toshio é apaixonado por Sayaka, mas ela só tem olhos para Gilbert. Motivado pelo ódio e inveja despertados por Toshio, uma entidade maligna de uma casa abandonada dos arredores entre em contato telepático com Toshio a fim de propor um trato faustiano.

Se Toshio ajudar a entidade a trazer seus amigos para a mansão a fim de devorá-los, a entidade não só irá poupar Toshio, como irá fazer com que ele e Sayaka fiquem unidos pela eternidade. O que poderia dar errado, não é mesmo?

RPG ou Adventure?

A jogabilidade é toda pela visão de Toshio, que vigia seus amigos através dos três olhos da criatura e os “guia” pela mansão os assustando através de uma das diversas criaturas que são controladas pela entidade. O desenvolvimento estético dessas criaturas variam entre horripilantes, simples, criativas e ainda contém algumas referências a mitologia e folclore mundial.

O segredo do gameplay é assustar os seus “amigos” o suficiente para correrem na direção certa, se aprofundando mais no labirinto da mansão. Porém sem matá-los de susto, ou fazer com que fujam da casa e venham depois com uma multidão para destruir o local. 

Porém a surpresa maior é como o jogo termina, caso você consiga levar todos seus amigos para serem alimentados pela entidade. Quase nenhum texto é mostrado, e a arte em si é bastante minimalista. Mas vemos o corpo nu de Sayaka sendo absorvido lentamente pela entidade enquanto as batidas do seu coração vão lentamente parando.

Uma arte que ficou no passado?

Com a virada da década, parece que o gênero perdeu o gás e caiu quase completamente no esquecimento. Jogos que misturavam elementos de RPG com terror ainda foram feitos, e eu irei comentar sobre eles num post futuro. Porém as características desses jogos haviam mudado drasticamente. Eles absorveram muitos elementos de ação e aventura comuns aos Action-RPG de sua época.

Já a estética simples de J-RPGs com jogadas de turno, gráficos de anime e enredos perturbadores pareceu algo ficado no passado. Ou será que não? Existe um jogo indie que foi lançado recentemente que parece ressuscitar essa estética trinta anos adormecida com primazia, vamos a ele!

WORLD OF HORROR
Ano de lançamento: 2019
Plataforma: Windows

Totalmente desenhado no aplicativo Microsoft Paint e sendo completamente influenciado pela arte dos mangás de Junji Ito, WORLD OF HORROR nos trás uma viagem do tempo através de seu gameplay e estética bastante similares aos jogos de PC-88 que passei esses dois artigos comentando. O jogo transita bastante entre elementos de J-RPG com os Graphic Adventures que fizeram sucesso na plataforma. 

O que mais me espantou ao pesquisar sobre o jogo é que seu desenvolvedor não é japonês, mas sim o polonês Paweł Koźmiński, e em entrevistas sobre o jogo ele cita as influências de Junji Ito, do escritor H.P. Lovecraft e até mesmo de filmes de body horror dos anos 70 e 80, mas não comenta sobre os jogos antigos de PC-88. Seria sua semelhança apenas acidental?

De qualquer forma o jogo tem uma abordagem inovadora e ao mesmo tempo nostálgica do terror em jogos digitais, com uma jogabilidade talvez difícil para que não é habituado ao gênero. Mas com ambientação e narrativa contagiante.

Esse artigo é parte de uma série de artigos sobre a história de jogos de terror, confira os outros:
O horror como gameplay antes do Survival Horror (1980 – 1989)
O Horror como temática em jogos de Ação e Aventura (1982-1992)
O horror atmosférico dos Adventures (1989 – 1998)
Os bizarros jogos RPG de terror japoneses
Parte 1 e Parte 2

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