Recentemente o blog da candidata democrata Hillary Clinton publicou uma matéria que acusa Donald Trump, de estar sendo apoiado por um grupo de supremacia branca americano. Sua prova? Um meme de um sapo que supostamente está influenciando a eleição americana.
Entenda melhor como o uso de um simples meme, o movimento alt-right e dois candidatos inusitados podem trazer tanta confusão.
Corrida eleitoral americana
Para quem vive em uma caverna ou está realmente desinteressado em política, esse ano irá acontecer a eleição presidencial americana. Os principais candidatos são Hillary Clinton, do Partido Democrata e Donald Trump, do Partido Republicano. Seguidos em menor escala pelos candidatos Gary Johnson do Partido Libertário e Jill Stein, do Partido Verde. Apesar de terem outros candidatos, o sistema eleitoral americano privilegia os dois maiores e tradicionais partidos.
Essa é talvez uma das eleições mais polêmicas que os EUA estão enfrentando. Do lado de Hillary, existem as acusações do envolvimento com crimes de guerra enquanto ela era Secretária de Estado. Já com Trump e sua experiência em reality shows, está levando a disputa a níveis quase satíricos. Como por exemplo levando pessoas a acreditarem que ele sequer queria ganhar. Os dois lados vivem se atacando por inúmeros motivos, mas sem dúvida o ocorrido mais inusitado foi o envolvimento de um certo sapo memético.
Um meme racista?
Postado originalmente no blog da Hillary Clinton, Hillary acusa o meme do Pepe de fazer parte do movimento “alt-right” (direita alternativa) e ser usado por supremacistas brancos para fazer campanha para Donald Trump. A acusação tem como base um artigo de the daily beast que dá toda a base para esse tipo de acusação.
Porém, algo que talvez não tenha entrado na conta do editorial do jornal e nem no time de relações públicas da candidata a presidência: A internet é um ambiente cruel, onde as piadas frequentemente saem do controle e pouca coisa deve ser levada a sério.
Teria o segundo maior partido político americano sido vítima de uma elaborada trollagem?
Conheça Pepe the frog (pepe o sapo)
Pepe é um meme popular baseado num sapo antropomorfizado (com formato de corpo humano) que é personagem de quadrinho chamado “Boys Club” de Matt Furie. Sua reação que primeiro viralizou foi a imagem “feels good, man”. Que mostrava o rosto feliz de pepe. Não demorou muito para outras imagens do sapo viralizarem.
Uma que fez um enorme sucesso no mundo, inclusive aqui no Brasil e que eu pessoalmente gosto mais, é o “sad frog” (sapo triste), ou “sad pepe”, que mostra o sapo com um olhar triste. Apesar de recentemente viralizado, a imagem é usada em chans (fóruns anônimos da internet) desde 2009. Em um curto espaço de tempo, sad frog se juntou com a cara triste de “that feel” outro meme associado com a tristeza e que evoluiu do “i know that feel, bro”. (memes são complicados).
Rapidamente diversas expressões de pepe viralizaram na internet, foram levadas ao todo da popularidade por cantoras pop como Nicki Minaj e Katy Perry e por fim acabaram usadas de qualquer forma por pessoas normais, o que irritou profundamente os channers que tinham valor sentimental pelo meme.
Guerra aos normies
“Normie” é nome que os usuários mais “hardcore” da internet dão as pessoas normais, que não conhecem as piadas recorrentes nem entendem o conceito dos memes (basicamente as nossos pais usando o facebook). E, para fazer com que os “normies” deixassem de usar os memes do Pepe, a comunidade estava disposta a associar o meme a imagens tóxicas, e foi o que fizeram.
Algumas imagens associavam o sapo a coisas nojentas, geralmente envolvendo urina e fezes. Para os que quiserem se arriscar a procurar, era chamado de poo poo pee pee, pesquisem por conta e risco. Porém estes memes não surtiram o efeito desejado. Uma grande piada que viralizou e enganou muitos foi o “tráfico de pepes raros”, onde um vendedor anônimo ofereceu uma coleção de milhares de imagens do pepe que ninguém teve acesso antes.
Por fim a causadora de toda a confusão foi o “Smug Pepe”, imagem que associava o sapo a atos antiéticos dos mais variados, inclusive se virando contra o “that feels” do qual fez parte o passado. Mas sem dúvida o que mais fez “sucesso” (ou polêmica) foram as associações a símbolos nazistas e racistas, entre eles, algumas ligações com a imagem de Trump.
Pepe, um meme a serviço da supremacia branca?
Devido a declarações polêmicas e postura controversa de Donald Trump em questões como imigração, o candidato é também associado ao pepe racista. Uma imagem especial, que mostra Trump com um grupo de pessoas desprezíveis parodiando o filme “Os Mercenários”, foi retuitada pelo próprio Trump, causando toda a confusão.
O artigo original que fez a ligação do meme com a ação de grupos de supremacia branca e Donald Trump cita como “líder da supremacia branca”o usuário @JaredTShift, onde ele mesmo diz (em minha tradução própria): “Nós praticamente misturamos Pepe com propaganda nazista, etc. Nós construímos essa associação.” e, principalmente:
“A maioria dos memes são efêmeros por natureza, mas pepe não é. Ele é o reflexo das nossas almas, para a maioria de nós. é nojento ver pessoas (normies, se me permitir) usem ele tão trivialmente. Ele pertence a nós. E nós faremos ele tóxico se for necessário”.
Seria tudo uma grande trollada?
O comentário de Jared já deixa claro que seu depoimento acompanha a história sobre pessoas tentando trazer o meme de volta para o underground e ele mesmo, em seu perfil pessoal do twitter, disse que é cínico com a política e que todas as declarações que fez do tipo eram irônicas. Levando a crer que Hillary Clinton foi “trollada” por um adolescente usando twitter. Ou que ele mesmo esteja trollando seu caminho para fugir da polêmica. Quem sabe?
Quem acompanha minimamente a cultura da internet sabe o quanto a repercussão de uma grande trollada é comemorada com louvor. Aqui no Brasil temos de exemplo a matéria fictícia inventada por Cid do Não Salvo dizendo que a Coréia do Norte tinha inventado os resultados da Copa. Essa trollagem repercutiu nos jornais do mundo inteiro.
Mas de fato a parte mais triste é: 1) Como a política foi transformada em espetáculo e entretenimento pela candidatura de Trump, que transformou tudo em um grande reality show, algo que tem experiência. 2) a falta de competência da mídia em fazer uma rasa pesquisa de origem de como funciona o meme antes de fazer a ligação de um grupo de pessoas fazendo piadas com a supremacia branca.
Será esse o futuro do jornalismo e a política? Teria mesmo um meme de internet ter força para balançar a eleição da maior potência militar do mundo? Infelizmente… não sabemos.
Descubra mais sobre a alt-right e a militarização dos memes nesse artigo que envolve a Taylor Swift
https://historiadorgeek.com.br/index.php/2017/01/18/kek-taylor-swift-alt-right-e-a-pos-verdade/